09 maio 2005

131 a 140 (funerais a funeral)

131
Ele adorava funerais. Misturava-se aos presentes e abraçava-os chorando, como nunca pudera fazer com sua família.

132
Atrás das grades, com o olhar posto ao longe no horizonte, após tantos anos ele já achava que o mundo é que estava preso.

133
Sua memória andava cada vez pior! Quando, finalmente, achou a chave do armário e o abriu, descobriu o esqueleto do amante esquecido.

134
Os sentimentos antigos mexem-se mais devagar e por isso demoram mais para sair do lugar.

135
O coelho que morava na cartola xingava o mágico que o espremia ali com dois pombos, uma dúzia de lenços coloridos e cinco cigarros acesos.

136
Quando o navio deixou o cais, seu espírito rumou célere para o horizonte, enquanto sua alma ficava presa para sempre em terra.

137
A perua gostava tanto de galinhar que para ela todo o pinto valia a pena.

138
"Eu robô" disse o andróide, entregando-se à polícia.

139
Naquela biblioteca, um único livro jamais havia sido retirado. No dia que aquela criança o pegou, o bibliotecário dormiu seu último sono sorrindo.

140
Seu funeral teve tantos discursos que o morto conseguiu ser ainda mais enfadonho do que fora em vida.
Microcontos de Carlos Seabra - http://seabra.com/microcontos

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